27 de outubro de 2008

Sonhos de Natal - Domingo, Dezembro 30, 2007


O que falta na minha família é um alcoólatra. Chega desse bom mocismo. Natal com conversas em tom amigável, comida gostosa, presentes e cada um pra sua casa. Precisamos de alguém para rolar na mesa, derrubar o peru, fazer a criança chorar. Talvez um alcoólatra com uma esposa dramática, que grite, o pegue pelos cabelos e o arraste até a saída, sob o olhar assustado dos demais. Todos se perguntariam como ela agüenta, e as crianças, pobrezinhas? Teríamos assunto para o resto da noite e para o almoço do dia 25.
Não, sem esse papo que não sei como é triste essa doença. Realmente não sei, mas sei como são chatas as festas com pessoas sóbrias e não as desejo a ninguém. Algumas boas doses a mais são indispensáveis e meu parente alcoólatra saberia dessa lição como ninguém.
E as piadas? Seriam tão melhores. Imagine só, no lugar de piadas com preconceitos disfarçados, teríamos piadas explicitamente incorretas, com os nomes certos dos sexos no lugar dos tananãs e na frente das crianças. Sem essa de passar o dedo pela pele, fale preto, fale criolo. Fale de uma vez que você odeia pobre, odeia viado. Meu parente alcoólatra falaria, assumiria tudo de pobre que há dentro dele com a desculpa da bebida, e todos fingiriam espanto.
Talvez ele nadasse pelado. Talvez gritasse que a casa é dele, e ele faz o que quiser. As mães tapariam os olhos das filhas. Os adolescentes dariam risada e se perguntariam qual mais ele aprontaria. Joga a tia na piscina! Eu estaria no coro. Vai desfazer a chapinha! Pessoas ceiando molhadas e de cabelo bagunçado.
E você? E você que é um vagabundo? E você que deu o golpe do baú? E você que teve um caso com a secretária? Chifruda! Sovina! Você roubou o próprio pai! Sim, ofensas no lugar de doenças alheias. Terminaríamos a noite brigados para fazer as pazes no dia seguinte, ou talvez no reveillon. Não, só no próximo natal. Ou nunca mais! Mentira. Todos se perdoariam, foi a bebida, foi o parente alcoólatra, mas ele não tem culpa, é uma doença, pobrezinho.

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