8 de outubro de 2012

Viagem a dois


Tinha um amigo que costumava viajar com suas namoradas assim que começava o romance. Dizia que era a melhor forma de saber se daria certo ou não.  Eu sempre quis testar essa teoria com meu atual namorado, mas nunca dava certo. Faltava dinheiro, faltava tempo, faltava sol. Por fim consegui.

Viajar com o namorado é de fato ótimo. Primeiro por motivos sexualmente óbvios, segundo por que é gostoso viver coisas juntos, só os dois, como se fosse um segredo, aquele sorvete delicioso que vocês descobriram, aquela praia bonita, aquele guia e suas piadas chatas, tudo vira história de nós dois, tudo vira amor. Ou não.

Ou não porque infelizmente meu amigo tinha razão, é uma ótima maneira de conhecer alguém, mas nem sempre se conhece o que se esperava.  Pode ser uma bela decepção.  Ok, decepção é uma palavra muito forte. Vamos chamar de leve tristeza.

Fiquei levemente triste por saber que ele não gosta muito da combinação areia-mar-piscina,  por exemplo. Poxa, eu gosto de ficar até o arroz secar. Como posso passar uma vida do lado de alguém que se contenta em ficar dez minutos na praia e já está bom? Alguém que prefere ver TV? Queria jogar a TV pela janela!

Mas o problema não é com ele, é comigo. Eu e minha eterna mania de fantasiar, romancear. Achava o que? Que uma pessoa que é extremamente cautelosa em tudo que faz se tornaria um aventureiro só porque está há algumas milhas longe de casa? Claro que não.  Seria até assustador.  

Talvez se eu só focasse em como ele superou o medo de avião para viajar comigo, em como ele quis me agradar diversas vezes, em como fui carinhoso e paciente, catando conchinhas, passeando pela orla, mas não, fico pensando na porcaria da piscina que ele não quis entrar. Nenhum dia.  

4 comentários:

Anônimo disse...

Este ano passei, com minha namorada, duas semanas em Florença e uma em Paris.
Nem tudo foi maravilhoso, a começar pela primavera mais fria em Paris desde 1887.
E isto é que foi bom: viver coisas boas e ruins sem que isto significasse um problema no relacionamento.
Um amigo que depois foi à Itália me disse que passou menos tempo e já não agüentava mais!
Lamento por ele.
Manoel Carlos

Anônimo disse...


Soneto de Fidelidade

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Anônimo disse...

Por ventura, a segunda pessoa desta viagem foi eu. Marco Henrique Zangiacomi, uma besta quadrada que não soube valorizar a mulher que eu amo e que sempre estarei esperando.

Anônimo disse...

História de amor

Vieste... E me falaste de um alguém infiel
que traíra a tua vida
e a quem deras no entanto o teu amor...
Vieste... E me falaste a linguagem de fel
da tua alma ferida,
( e em teus olhos havia atormentada e presa
uma imensa tristeza, um profundo amargor...)

Quem te viu como te vi - a falar a linguagem
da suprema amargura
da incurável desilusão,
como quem abatido chega ao fim da viagem
e encontra um velho sonho de ventura
em pedaços no chão...

Quem te viu como eu vi – beirando o precipício
e quase em desatino,
sem saber procurar se quer um novo início
para o seu destino...

Vieste... e eu dei-te o abrigo dos meus braços,
- comovi-me... e senti meus olhos baços
diante da tua dor...
e sem que eu próprio saiba como consegui
aos poucos, muito aos poucos, dia a dia, eu vi
que vencias o infiel, o amargurado amor...

Uma tarde... em que te vi chegar, rindo e chorando,
numa emotividade
que punha em teu olhar imprevisto esplendor,
pensei que nessa tarde enfim, eu te pudesse
desvendar meu segredo de felicidade
e pedir teu carinho para meu amor...

Chegaste... Me entregaste a mão, e me disseste
entre terna e comovida:
- Ah! Meu amigo!
nem tu compreenderás todo o bem que fizeste
agora que afinal posso seguir de novo
radiante, sem perigo...

E entre terna e comovida
silenciaste,
e me entregaste a mão...

Era a despedida...
- pior que a despedida: - era a separação...
Num derradeira gesto impensado, numa alegria louca
no instante de partir:
- beijaste-me na boca
e te foste a sorrir...

Para que? Para que me beijaste-me na boca?
Hoje a minha alma sofre , e o meu desejo goza
a angústia dessa lembrança...
Ah! Meu amor... o quanto foste louca
e impiedosa,
o quanto foste criança!

( Poema de JG de Araújo Jorge, extraído do livro
"Meu Céu Interior", 1ª edição, 1934 )